segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Domingos com Roberto

Fim de ano é tempo de chocotone, comidas legais, festa da firma, amigo secreto...E Especial de Natal do Roberto Carlos.

Nem sempre o Roberto foi esse cara chato que ele é hoje. Ou foi, sei lá, mas não tanto quanto hoje. As músicas antigas dele, algumas em parceria com o grande Erasmo Carlos, são muito legais (algumas, pelo menos).

E a primeira vez que me dei conta disso foi há uns anos, quando meu pai encontrou por acaso numa loja um cd, remasterização de um álbum antigo do rei: "Roberto Carlos - O Inimitável".


Disco de 1968, com 12 faixas, das quais só 4 são em parceria com o Erasmo. E lá estava meu pai ouvindo Roberto Carlos a todo volume, como ele fazia todos os domingos, quando ouvi essa daqui:


- Pai, toca de novo essa música?
- Ih, tá apaixonada...
- Ai, pai...


Depois disso, prestando mais atenção nesses discos antigões do Rei Roberto, achei mais coisa legal, principalmente no álbum de 1967, "Roberto Carlos em Ritmo de Aventura". A CLÁÁÁÁSSICA "Como é Grande o meu Amor por Você" é desse disco:


E essa daqui, "É Tempo de Amar", é fofinha por causa dos versos "Deixe de ser triste assim/Esqueça o que passou/Esqueça que você chorou/ Carinha de tristeza não lhe fica bem..."



Ainda no mesmo disco, essa que eu adoro: "Folhas de Outono". "Ainda nela eu penso/Com muito carinho/As folhas vão caindo/E eu choro baixinho...". Muito amor.


E finalmente, a música que seria meu tema se eu fosse protagonista de novela do Manoel Carlos. Atenção para os versos: "Não vai ser fácil, eu bem sei/ Eu já procurei/ Não encontrei meu bem/ A vida é assim/ Eu falo por mim/ Pois eu vivo sem ninguém...". Awn.


Optei por ficar só nas baladinhas, mas o Roberto também tem uns "rock" no currículo. Quem acha que RC é só "Detalhes" e "Esse Cara Sou Eu" tá por fora, bicho.

Também passei domingos com Raul Seixas, Nelson Gonçalves e Luiz Gonzaga. Falo de cada um deles aqui posteriormente.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Cry to me



Gosto muito dessa música, uma das faixas da trilha sonora do filme "Dirty Dancing" (1987). E sim, sou louca pelo filme também.

Mas quando tava procurando por ela pra tirar uma dúvida (sei lá de onde tirei que era o Otis Redding que cantava), achei essa versão da Duffy e...♥



sábado, 14 de dezembro de 2013

Guia felino para cuidar de humanos

Guia bem humorado para gatos cuidarem de seus humanos. Ou você acha que é a gente que cuida deles? Silly human. =)


Vi no Paw Bonito.

Nossos problemas acabaram!

Esse assunto já é antiguinho, e eu até queria ter falado dele aqui antes, mas...Vieram as provas de fim de semestre, e as provas de concurso pra estágio, e todos os meus revertérios emocionais...Enfim, eis a oportunidade.

Ultimamente, tenho dedicado um pouco do meu tempo pra ler mais sobre feminismo, pra acompanhar um pouco mais as discussões acerca da desigualdade entre os gêneros etc. E outro dia, esse vídeo apareceu na minha timeline do Facebook. Infelizmente, não é trollagem: a Bic fez mesmo uma caneta pra mulheres. E pesquisando nas papelarias, constatei que o preço também não é brincadeira: uma embalagem com 4 unidades de caneta Bic "comum" custa R$ 4,40, enquanto uma, SÓ UMA, Bic for Her custa R$ 9,30.

Parece bobagem, mas não é. E usando o humor, a Ellen tocou num assunto que muita gente evita, ridiculariza, torce o nariz, prefere fazer de conta que não vê: o mundo é machista. Tenho amigos (e, infelizmente, amigas) machistas, minha família é machista...A gente é criada assim, e quando se dá conta, tá tecendo comentários machistas também, sem perceber que o impacto do machismo nas nossas vidas é grande, e o preço, altíssimo.

Vou tratar melhor desse assunto aqui em breve, com números e reportagens e dicas de leitura e a porra toda. Por enquanto, fiquem com o vídeo da Ellen DeGeneres.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Beijo na testa e gozada na cara

Sou um amontoado de citações, letras de música e falas de comédias românticas água-com-açúcar dos anos 90.

Sou 30 anos de clichês românticos.

Mesmo com tanta coisa acontecendo no mundo real, tanta coisa que me afeta diretamente, tenho me refugiado nos filmes que marcaram minha adolescência pra tentar entender o motivo pelo qual eu sou assim: essa bagunça temperamental da qual todos fogem, que todos evitam, a qual todos irrita com cobranças e questionamentos e desconfiança.

Passei os últimos dias tentando encontrar palavras pra descrever como é, como eu raciocino com esse meu jeitinho todo especial de foder com a porra toda e chego a conclusões estapafúrdias (adoro essa palavra), conclusões essas que, na boa?, você não vai conseguir abalar sequer um pouco, não importa o argumento que use. Taí uma coisa que sempre dizem de mim: que sou cabeça dura, e que quando implico, quando cismo que as coisas são do jeito que penso que são, já era. Uma amiga minha me chama carinhosamente de "concretinho" por causa disso. Aí eu assisti aos meus filmes românticos, chorei, ouvi as músicas das trilhas milhares de vezes, escrevi, postei trechos dos filmes...E o post ficou gigante. Desisti de tentar terminar.

Desisti de tentar explicar, na verdade. Explicar pra quem? Pra quê? Todo cara com quem me envolvi nos últimos tempos deve dar graças aos deuses por ter se livrado de mim. E nessas de querer entender o porquê que isso acontece, fui atrás de pistas nos filmes. Por que os filmes? Porque num comentário no outro blog, um cara disse que sou romântica, por isso meu desconforto em constatar que o "amor-tesão" como ele coloca, não anda junto necessariamente com o "amor-romântico". E que somos induzidos a acreditar na fórmula amor-rômantico + amor-tesão por causa dos milhares de filmes e séries e novelas que consumimos ao longo da vida.

Eis o comentário do leitor:

"Barbara, acho que você mesma apontou a conclusão. Você é romântica, como a maioria das pessoas de nossa época e lugar. No modelo de amor do romantismo, que predomina nossa sociedade, amor e paixão são conceitos indissociáveis. Há quem o chame de "amor-paixão" Procuramos Um Grande Amor, A Metade da Laranja; e essa pessoa deve necessariamente aquela por quem sentiremos O Grande Tesão, uma atração irresistível. Mas será mesmo que as pessoas por quem sentimos O maior Tesão, é a mesma com quem queremos compartilhar uma casa, criar uma criança juntos? Na vida "vida real", nosso carinho, companheirismo, cuidado mútuo - características que atribuímos ao Amor - muitas vezes estão dissociados com tesão, desejo, fetiche, paixão da mesma forma que no modelo romântico. A grande questão é que temos poucos referenciais de amor que não se enquadre no modelo romântico. A maioria dos filmes, seriados, novelas - que servem de modelo para nosso comportamento social - seguem a linha romântica. Daí a dissociação entre o que esperamos sentir e o que verdadeiramente sentimos; gera um descompasso, um desconforto..."

Quando se está escrevendo sobre putaria, você quer ser chamada de tudo, menos de romântica. Mas a verdade é que eu sou, sim. E meu alterego putanheiro falhou estrondosamente em disfarçar isso. Foi então que me dei conta que, de fato, novelas e filmes e séries e músicas, tudo isso serve "de modelo pro nosso comportamento social", o que não quer necessariamente dizer que são só mentirinhas, historinhas fofinhas que servem pra tornar nossa vida menos filha da puta. Ou são e eu sou trouxa? Falando assim, soa como se eu ainda acreditasse em Papai Noel, sei lá. Aí eu pensei: "Por que não assistir de novo a comédia romântica referência total da minha adolescência e ver se ainda acredito em tudo que tá lá? E eu procurei, achei e assisti. E quase não parei mais de chorar.


Ainda tá tudo lá: todos os problemas de autoestima da protagonista, a idealização do amor-romântico, a dor da rejeição...Tudo com o que eu me identifiquei quando tinha, sei lá, 13, 14 anos tá lá. E o pior: eu ainda me identifico. Talvez, mais do que nunca.

E eu fiquei pensativa, e bebi tudo o que tinha em casa, e chorei, e ouvi Nessun Dorma (que toca no fim do filme) milhares de vezes. E desde então, toda noite tenho assistido um filme da década de 90 cujas referências românticas tornaram minha vida amorosa essa tragicomédia cheia de lugares-comuns e frases feitas.

E querem saber? FODA-SE. Eu sou romântica. Eu quero um Gregory Larkin, que repare nas minhas manias mais bobas e me ache adorável ao invés de doida. Ainda melhor: quero um Mark Darcy, que goste de mim do jeito que eu sou e de quem eu não precise esconder meus "wobbly bits". 


Quero alguém com quem eu possa conversar sobre tudo, e o tempo passe tão rápido que a gente nem se dê conta de estamos falando há horas. Quero um "Antes do Amanhecer". 


Quero alguém que goste de mim do jeito que eu sou, alguém que saiba as coisas mais embaraçosas a meu respeito e ainda assim goste de mim. Quero fins de semana preguiçosos em casa, vendo filme e comendo pizza, e quero noites de bar e cerveja e classic rock. Quero game nights. Quero viagens a dois. Quero foder. Quero me sentir desejada, quero putaria ao pé do ouvido, por sms e e-mail. Por que caralhos dissociar amor de tesão quando se é perfeitamente possível sentir os dois pela mesma pessoa? Beijinho na testa e gozada na cara convivem harmoniosamente, pelo menos na minha imaginação.

Mas mesmo querendo tudo isso, e querendo acreditar do fundo do coração que é possível existir relacionamento assim, outro elemento é somado a equação: o tempo. Tô velha e o tempo tá passando, as amigas tão casando e eu aqui, dando murro em ponta de faca, como dizem. E se relacionamentos amorosos forem só isso que a gente vê por aí? Alguém com quem você vai ficando, vai ficando e, quando vê, tá casado e com filhos, pagando prestação da casa e do carro? E a mesmice e as responsabilidades vão deixando tudo mais chato, mais sem gosto, e o olhar tem aquela opacidade de olhar de bicho de cativeiro.

Provavelmente, nunca vou experimentar nenhum dos dois: nem a sensação de andar nas nuvens dos relacionamentos de filmes românticos, nem a realidade nua e crua dos relacionamentos pé-no-chão. Nem nunca vou entender o que me faz estragar tudo sempre. A Superinteressante já tinha me avisado que filmes românticos estragam nossas vidas, e talvez eles façam mesmo a gente criar expectativas demais e complicar demais o que era pra ser simples. Mas na real? As histórias podem até ser bobinhas e cheias de clichês cafonas, mas as trilhas sonoras são maravilhosas.

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

A chatice dos "ismos" (e ódio, sexo, mentiras & videotape no Facebook)

Tive uma quarta-feira péssima. Não dormi direito, fui mal na prova de Direito Civil (agora só um milagre pra me salvar do exame; e se ficar de exame, SEI que vou ficar de DP)...Não me restou outra saída a não ser encher a cara no bar. Fiquei dando risada da cara dos são-paulinos que estavam assistindo o jogo e depois voltei pra casa pra jogar Candy Crush.

Ontem, cheguei a separar algumas coisas pra postar aqui, mas fiquei com preguiça (e tinha que estudar pra prova, mesmo que fosse inútil). Então, agora vai:

Save Ferris

"Ferris Bueller's Day Off" é um dos meus filmes favoritos, e o Ferris é o meu mestre, meu guia, meu Dalai Lama. Separei essa cena aqui porque tava numa conversa com uma amiga minha sobre socialismo, feminismo, machismo, esquerda e direita, e sempre lembro do Ferris dizendo que acha que "ismos não são bons", e que as pessoas deveriam acreditar nelas mesmas, tipo o John Lennon. Concordo plenamente, mestre Bueller.


Cadê fé na humanidade?

Eu, que sou sempre otimista otária, tenho visto tanta merda nazinternétis que receio estar perdendo a fé na humanidade.

Gente abandonando cachorro em avenida, botando pra fora do carro sem a menor cerimônia; homem babaca que posta vídeo íntimo de ex, que não aguenta a pressão dessa sociedade machista hipócrita e acaba se matando...Olha, não tá fácil.

E eu tava lendo um texto falando do espaço pra disseminação de ódio que se tornou o Facebook e, pouco antes de dar adeus ao mundinho da curtição do sr. Zuckerberg, vi isso aqui:

Fonte: Arte Destrutiva
Anos atrás, quando criei perfil no Facebook (e a galera ainda tava toda no Orkut), o grande barato da rede social era compartilhar coisa bacana que a gente ficava sabendo e queria que nossos amigos e familiares soubessem também, além, claro, de postar fotos de rolês daora, de animais de estimação, do que a gente quisesse. E hoje virou essa bosta, com vídeo de sexo vazando, foto de bandido decapitado, um salmo no meio disso tudo pra descontrair, "até que enfim é sexta!", e por aí vai. E é decepcionante ver o rumo que as coisas tomam porque antes, se eu quisesse evitar "chorumentário", era só não ler os comentários de internauta nas notícias do UOL e do G1. Mas infelizmente essas pessoas também tem Facebook, e fazem questão que a gente saiba que elas acham o humor do Danilo Gentili inofensivo, que odeiam o PT, que o Bolsa Família sustenta vagabundo e compra voto dos esfomeados do nordeste, essas merdas. Aliás, tem um texto bem bacana na CartaCapital sobre esse tipo de "pensamento" (sim, entre aspas, porque quem tem esse tipo de opinião não pensa).

Enfim, voltando ao lance da imagem aí de cima: eu tava puta, ia ficar longe do FB por um tempo, até ver essa imagem. Não foi o que me motivou a ficar, não. Mas é o tipo de coisa que faz a gente recuperar um pouquinho da fé perdida. Se tem gente que compartilha vídeo íntimo pra humilhar os outros, imagens de violência gráfica e toda sorte de mensagens de ódio e intolerância, também tem quem compartilhe coisa útil, bem humorada e conteúdo que faça as pessoas refletirem pelo menos por uns segundos sobre essas merdas todas acontecendo.

Pretendia falar mais a respeito dessa canalhice de vazar vídeo de sexo, mas o PC Siqueira é um lindo e fez um vídeo dizendo TUDO o que eu queria dizer.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Lenda

"Abel e Caim encontraram-se depois da morte de Abel. Caminhavam pelo deserto e reconheceram-se de longe, porque os dois eram muito altos. Os irmãos sentaram-se na terra, acenderam um fogo e comeram. Guardavam silêncio, à maneira das pessoas cansadas quando declina o dia. No céu assomava uma estrela que ainda não tinha recebido seu nome. À luz das chamas, Caim percebeu na testa de Abel a marca da pedra e deixou cair o pão que estava prestes a levar à boca e pediu que lhe fosse perdoado seu crime.

– Tu me mataste ou eu te matei? – Abel respondeu. – Já não me lembro; aqui estamos juntos como antes.

– Agora sei que me perdoaste de verdade – disse Caim –, porque esquecer é perdoar. Procurarei também esquecer.

– É assim mesmo – Abel falou devagar. – Enquanto dura o remorso, dura a culpa."
 Elogio da Sombra - Jorge Luis Borges

Tô num relacionamento sério com o volume 2 das Obras Completas do Borges que peguei na biblioteca da UMC semana retrasada. E na expectativa pra edição 2013 da Festa do Livro da USP, pra ver se acho livros dele e do Cortázar em conta lá.

Facts about cats

Curiosidades felinas.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Cisne Negro

Tô toda inspirada hoje (e não, ainda não dormi)...

O filme "Black Swan" é um dos meus favoritos, e prometo que qualquer dia falo dele aqui com mais calma. Definitivamente merece um post.

Mas esse post aqui vai ser só pra mostrar 3 das minhas passagens favoritas. Já que tenho postado trechos de livros, não custa compartilhar trechos de filmes também.

A sinopse e a ficha completa do filme estão aqui, by the way.


"You could be brilliant! But you are a coward!"

Já falei aqui no blog diversas vezes sobre o quanto costumo me autossabotar (alerta de auto-ajuda). Encontros que desmarco, eventos aos quais não apareço, entrevistas de emprego em que dou o cano, trabalhos da faculdade que começo e não termino...A lista é grande. E sim, é por medo. Assim como a Nina (Natalie Portman), sou covarde. Mas sei que se me esforçasse, se não me sabotasse tanto, se parasse de "choramingar", conseguiria ir mais longe. Então, quando a covardia grita e eu já tô pensando numa desculpa boa pra desistir, me lembro dessa cena:


"The only person standing in your way is you!"

Sim, quando a gente é expert em se sabotar, nosso maior inimigo é a gente. Hoje em dia, rola um papo facebookiano, principalmente entre as meninas funkeiras cujo mote é sempre "as inimigas": o "recalque" das inimigas que bate não-sei-onde e volta; "beijinho no ombro" pras inimigas...Bitches, please. Vocês não são os Power Rangers ou a She-Ra (já falei que sou louca pela She-Ra, né?) pra terem inimigas. Como diz uma frase num post anterior, as pessoas não estão contra você, mas a favor delas mesmas. O universo não conspira contra você. Na verdade, ele não poderia se importar menos com você. Então pára de ficar arrumando pretexto e vai à luta. It's time to let it go.


The Black Swan

O Thomas (Vincent Cassel) fala tanto pra Nina se soltar, deixar rolar, não se preocupar tanto em ser perfeitinha, que ela finalmente se liberta...Mas as consequências são trágicas. Nessa primeira cena dela como a "Nina do Lado Negro da Força", a gente percebe no olhar, na autoconfiança, na expressão facial, nos gestos, na leveza da dança...Natalie, SUA LINDA, você mereceu muitíssimo o Oscar por essa atuação! É como se REALMENTE estivéssemos de frente com a gêmea malvada do Cisne Branco (um minuto de silêncio pelos que falam "cisnei"...puta que pariu): a antagonista, a vilã. A transformação atinge o ápice nessa cena, e pra Nina esse foi o "point of no return". Me arrepio TODA VEZ na hora das asas.


No post que pretendo fazer sobre o filme, postarei mais cenas, além das minhas impressões a respeito delas, da história, de tudo. Eis um dos filmes que não canso de assistir.

Momento "frase para Facebook"

Independente do meu amado Gandhi ter dito isso ou não, taí algo que eu tento praticar sempre: harmonizar meus pensamentos, meus discursos e meus atos. E é difícil, viu. Mas se o resultado é felicidade, não custa tentar.


Fonte da imagem: O que te inspira?



quarta-feira, 20 de novembro de 2013

A ignorância é atrevida, arrogante etc.

"Há alguns dias, recebi mensagens de leitores que me pediam comentários sobre um trecho da entrevista concedida a um jornal capixaba por Sheila Ramos Vieira, que estuda medicina em Cuba. O trecho que motivou as mensagens é este: "No Brasil, com certeza, seria muito difícil para mim fazer um curso de medicina".

Quase todas as mensagens dos leitores citavam as "redes sociais", nas quais a frase da nossa estudante de medicina causava manifestações de alto grau de sentimentos primitivos (o ínclito filósofo Roberto Jefferson que me perdoe por roubar-lhe o nobre pensamento, expresso por ele em relação a José Dirceu quando denunciou o esquema do mensalão).

Costumo fazer o que me pede um dos meus filhos ("Não leia os comentários das notícias, pai; não envenene o fígado e a alma"). De fato, não fui atrás, porque o que foi transcrito nas mensagens que recebi bastava.

Os "especialistas" em língua portuguesa disseram o diabo sobre o "nível" da futura médica ("Como uma analfabeta pode ser médica?" e besteiras afins). Nem preciso comentar o aspecto ideológico desse besteirol, certo?

Posto isso, vamos nos concentrar na estrutura sintática da frase atribuída a Sheila. Vamos repetir a construção: "No Brasil, com certeza, seria muito difícil para mim fazer um curso de medicina". Nas mensagens perpetradas nas redes sociais pelos "especialistas" em língua portuguesa, condena-se veemente e rispidamente o "erro" no emprego do pronome oblíquo "mim", posto antes de "fazer", verbo no infinitivo.

Mas quem foi que disse que esse tipo de problema se resolve pela posição dos termos? Quer dizer que não se pode, de jeito nenhum, usar o pronome "mim" ao lado de um infinitivo?

O problema não é de lugar, de posição; o problema é mesmo sintático (morfossintático, para ser mais preciso). Na língua culta, o pronome "mim" não funciona como sujeito, o que explica por que nesse registro não ocorrem construções como "Ela fez o possível para mim ficar aqui". Nesse caso, no lugar de "mim", ocorre o pronome reto "eu", que funciona como sujeito de "ficar".

É muito fácil perceber por que esse "eu" é sujeito de "ficar". Um dos caminhos é trocar "eu" por "nós" ou "eles", isto é, por um pronome reto plural. O que acontece com o verbo? Varia: "Ela fez o possível para nós ficarmos/para eles ficarem aqui". Outro caminho é trocar "para" por "para que": "Ela fez o possível para que eu ficasse aqui". Percebeu? O pronome "eu" permanece na frase, agora como sujeito de "ficasse".

Na frase de Sheila, o que há é apenas o emprego dos termos na ordem indireta, o que faz o pronome "mim" encostar em "fazer", o que, para os afoitos, já basta como prova do "erro". Não há erro algum, caro leitor. Esse "mim" é "mim" mesmo, já que não está ligado ao verbo "fazer", por isso não pode ser o seu sujeito. Esse "mim" está ligado ao adjetivo "difícil" ("tal coisa é difícil para alguém").

Vamos dispor os termos em outra ordem? Vamos lá: "Fazer um curso de medicina no Brasil com certeza seria muito difícil para mim". E agora? Alguém se atreveria a trocar esse "mim" por "eu"? Algum dos nobres "especialistas" diria "Fazer um curso de medicina no Brasil com certeza seria muito difícil para eu"? Francamente...

Em tempo: o "corretor" do Word também mete os pés pelas mãos... Rarará! Na frase de Sheila, o dito grifa o pronome "mim" (o grifo some quando se troca "mim" por "eu").

Não há erro algum na frase da nossa futura médica. O erro está na prepotência, na ignorância e na arrogância dessa turba raivosa. É isso.
"
 Pasquale Cipro Neto para FOLHA DE S. PAULO

Embora meu português não seja lá essas coisas, quando alguém se acha no direito de passar lição de moral sobre o que quer que seja escrevendo de um jeito quase ininteligível, na boa: mando se foder e voltar pra escola.

Mas ao invés de partir pra agressão gratuita fazendo uso desse tipo de artifício, tentando ridicularizar e, assim, descredibilizar quem cometeu o erro, o que eu faço é justamente apontar falhas nos discursos de quem acha que tá arrasando, fazendo um puta dum sucesso com sua "opnião" que "concerteza" vai receber várias curtidas no Facebook e acabar com a festa, me tornando a arrogante da vez.

Digo isso por conta de um episódio envolvendo dois de meus colegas do curso de Direito. Um deles me marcou numa publicação em que comentava sobre as prisões da AP 470, o "Mensalão". Marcou também esse cara, um certo desafeto meu. Long story short, num dado momento da discussão me irritei com o fato de que ele só sabia falar coisas desconexas, e meu colega e eu realmente não entendíamos o que ele tava dizendo. "Petista agora só diz isso...kkkkkk....não sabe de nada....chora PT!", ao que nós insistíamos "Na boa, a gente não entendeu o que você quis dizer antes...A gente não sabe do que você tá falando!". E ele continuava: "O Maluf falou a mesma coisa! kkkkkkk E agora o Lula também...kkkkk...é só o que petista sabe dizer mesmo!". Não ia adiantar discutir. Aí eu postei esse vídeo:


Eis que o burro (vou me referir assim a ele a partir de agora) só viu o vídeo ontem, e claro, não deixou barato. Tá lá se acabando de falar de mim, aquele mesmo mimimi de aluno de Ensino Médio zoando nerd na sala: que eu sou a nerd sem amigos que não tem vida social, que sou arrogante, que me acho melhor que os outros, que sou motivo de piada na sala de aula, que meu "falso intelectualismo" não engana ninguém etc.

Meu colega ficou mais indignado que eu: veio falar comigo depois da aula, se dizendo chocado com o nível a que a discussão chegou. Falei pra ele deixar quieto, ainda dei mais uma resposta pro burro (no mesmo nível dos comentários dele) e pronto.

Ele fez uso de muita coisa que tinha o objetivo de me ofender, o que descaracterizou completamente o debate. Fez uso daquela tática básica de atacar o argumentador e não o argumento. Me irritei e o chamei de burro, ao que ele revidou despejando todos as piadinhas de estereótipos possíveis de serem usadas nessas horas. Danilo Gentili would be proud.

Nem sei por quê tô falando disso aqui porque tô puta, mas a verdade é que vejo de maneira distinta os dois casos. No caso contado pelo Pasquale, o intuito de quem criticou a estudante de Medicina era claramente ridicularizá-la, tirando o crédito do que ela dizia ("Como uma analfabeta pode ser médica?"), o típico ataque ao argumentador sobre o qual falei. Enquanto eu, criticando o burro e quem quer que seja que age como ele, combato os argumentos, só fazendo uso desse artifício (apontar erros de português) como defesa, quando meu interlocutor se acha no direito de dar lição de moral, quando a ignorância e a arrogância falam tão alto que saem absurdos como "O [ministro do STF] Luis Roberto Barroso...não sei o que aquele cara tá fazendo lá! Nem tem  notável saber jurídico! Não sabe nem usar o plural!". Você vai rebater a crítica, o colega concorda contigo mas o burro não pára: "Me sinto lisongiado (sic) kkkkkkkk se juntam os dois e não dá um kkkkkkk". Um ministro do STF não é digno do cargo porque não sabe usar o plural, mas você escreve errado pra caralho, num discurso vazio e nonsense, e eu tenho que te respeitar? Olha...Né fácil, não.

Não corto o cabelo em salão cuja placa diz "cabeleleiro", nem compro fruta em quitanda que diz que vende "melância". Até já falei aqui de ex-peguete loser que não sabe escrever e de ex-affair cuja namorada escreve "enteressada", "anciosa" etc. Mas isso por ser uma implicância MINHA (quando não é puro despeito por saber tanto e ser tão culta e ler tanta coisa, e nada disso servir pra manter por perto quem eu gosto). É o mesmo tipo de implicância que tenho com livros de auto-ajuda, ou do Paulo Coelho, por exemplo. Encaro como um defeito, mas nunca faria uso disso numa discussão, tipo "Ah, como alguém pode comprar panos de prato de uma analfabeta?". Me poupem. Isso é digno de "chorumentário" de portais como o G1 e o R7.

Tudo indica que vou continuar sendo a persona non grata da classe, com fama de arrogante por essas e outras discussões. Mas prefiro usar as mesmas armas da turba raivosa contra ela do que tentar ter uma discussão produtiva com gente incapaz de tecer um comentário sem um ataque pessoal no meio, achando que assim sai por cima no fim da debate. Por mais burro que seja, não deve ser difícil sacar quando as pessoas simplesmente cansam de responder e desistem, justamente por saber que seu déficit cognitivo o impede de ver o quão estúpido e vazio seu discurso é. Prepotência, ignorância e arrogância também (e principalmente, diria) acomete pseudointelectuais.
 

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Earworm

Tempos atrás, li na Superinteressante (sempre ela, né?) que aquele lance de ficar com uma música na cabeça, repetindo o mesmo trecho all the time, e que a gente simplesmente não consegue evitar se chama "earworm".

O meu earworm dessa semana é uma música do Los Hermanos, banda que eu não gosto. E como a matéria diz que a gente tem que cantar a música pra se livrar do efeito looping, here I go:


Em tempo: a matéria da Super esclarece que o tal fenômeno é como uma "coceira cerebral", mais suscetível em mulheres (não se sabe o motivo), e que músicas repetitivas, com oscilações na voz ou frases marcantes são as mais grudentas. Pra quem quiser, a matéria completa tá aqui.

"...E até quem me vê
lendo jornal
na fila do pão
sabe que eu te encontrei..."

Droga. Maldita coceira.

Cat lady's nights

Alguém compartilhou no Facebook e achei fofo demais.


segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Travessuras da Menina Má

Quando peguei esse livro do Mario Vargas Llosa na biblioteca da faculdade, peguei também o "A Festa do Bode", do mesmo autor e sobre o qual já falei aqui. Intercalava a leitura dos dois, mas aos poucos fui gostando mais do segundo, e deixei a história do "Ricardito" Somocurcio de lado. Achei o começo chato, a história demorou a engrenar, sei lá. Acredito até que a culpa seja do Ricardito mesmo, tremendo otário...

A menina má em questão é uma camaleoa, alpinista social que topa tudo pra ter a única coisa que realmente traz felicidade e segurança na vida: dinheiro. Ela e Ricardo se conhecem ainda crianças e são muitos os encontros e desencontros dos dois. Ricardo amava tanto a peruanita (não se sabe ao certo o nome dela, de tanto que a maldita mudava de nome, de país, de marido etc.; mas o mais certo é que seu nome verdadeiro era Otília) que tolerou MUITA coisa. Na boa, chega a dar raiva (e olha que sou bem trouxa quando me apaixono).

Foi aí que deu o estalo e eu não consegui mais largar o livro: bateu a síndrome de Roberto Carlos, e eu lia embasbacada tudo o que o imbecil do Ricardo fazia e pensava "esse cara sou eu!". Piadas à parte, a paciência, o carinho, a fé, e acima de tudo, o amor desse cara eram praticamente inabaláveis, mas não consigo dizer se em algum momento ele foi correspondido pela menina má.

O trecho a seguir mostra bem o sofrimento do Ricardito "bom menino" e a desfaçatez da menina má. Não consigo me lembrar de personagem mais forte, fria e dissimulada que ela. Amei. E odiei. Leiam e tirem suas próprias conclusões.


"Cheguei à Ponte Mirabeau literalmente ensopado. Eu nem tinha notado que estava chovendo. Por ali não passavam pedestres nem carros. Avancei até o meio da ponte e sem hesitação me encarapitei na grade metálica, onde, já me preparando para pular - juro que ia fazê-lo -, senti um golpe de vento no rosto e, ao mesmo tempo, duas manzorras que abraçavam as minhas pernas, puxavam e me faziam cambalear e cair de costas, no asfalto da ponte:

- Fais pas te con, imbécile!

Era um clochard que cheirava a vinho e sujeira, meio perdido dentro de um grande impermeável de plástico que lhe cobria a cabeça. Tinha uma barba enorme, de uma cor entre cinza e esbranquiçada. Sem me ajudar a levantar, pôs a garrafa de vinho na minha boca e me fez tomar um gole: era uma coisa quente e forte, que me sacudiu as vísceras. Um vinho passado, quase vinagre. Tive ânsias de vômito mas não vomitei. Fais pas te con, mon vieux - repetiu. E, dando meia-volta, se afastou trôpego com sua garrafa de vinho azedo balançando na mão. Percebi que nunca mais esqueceria aquela sua cara amorfa, aqueles olhos arregalados e congestionados e sua voz rouca, humana.

Voltei caminhando para a rue Joseph Granier, rindo de mim mesmo, cheio de gratidão e admiração por aquele vagabundo bêbado da Ponte Mirabeau que tinha salvado a minha vida. Eu ia pular, certamente teria pulado se ele não me impedisse. Estava me sentindo estúpido, ridículo, envergonhado, e tinha começado a espirrar. Toda aquela palhaçada barata ainda ia terminar num resfriado. Os ossos das minhas costas doíam com a pancada no chão e eu só queria dormir, dormir o resto da noite e da vida. Ao abrir a porta do apartamento vi um fiozinho de luz lá dentro. Atravessei a salinha de jantar em dois pulos. Da porta do quarto divisei a menina má, de costas diante do espelho da cômoda, experimentando o vestido de bailarina árabe que eu tinha comprado no Cairo e que ela certamente nunca usara. Deve ter me ouvido chegar, mas não se virou. Era como se um fantasma houvesse entrado no quarto.

- O que está fazendo aqui? - disse, gritei ou rugi, paralisado na entrada, sentindo que minha voz soava muito estranha, como a de um homem sendo estrangulado.

Com muita calma, como se nada estivesse acontecendo e toda aquela cena fosse a coisa mais corriqueira do mundo, a figurinha morena, seminua, envolta em véus, de cuja cintura caiam umas fitas que podiam ser de couro ou correntinhas, virou-se de lado e olhou para mim, sorrindo:

- Mudei de idéia e estou de volta. - Falava como se me contasse uma intriga de salão. E, passando para coisas mais importantes, apontou o vestido e explicou: - Estava um pouco grande, mas acho que agora ficou bem. Como cai em mim?

Não pôde dizer mais nada porque eu, não sei como, atravessei o quarto num pulo e a esbofeteei com todas as minhas forças. Vi um brilho de pavor nos seus olhos, vi que ela oscilava, tentava se apoiar na cômoda, caia no chão e depois dizia, ou talvez gritasse, sem perder totalmente a serenidade, aquela sua calma teatral:

- Você está aprendendo a tratar as mulheres, Ricardito.

Eu tinha caído no chão junto com ela e a sacudia pelos ombros, enlouquecido, vomitando meu despeito, minha fúria, minha estupidez, meus ciúmes:

- Eu só não estou agora no fundo do Sena por milagre, e a culpa é sua, só sua - as palavras se atropelavam na boca, minha língua travava. - Nestas últimas 24 horas você me fez morrer mil vezes. De que está brincando comigo?, diga. Foi para isso que me ligou, que me procurou, quando eu já tinha me libertado de você? Até quando acha que vou agüentar? Eu também tenho meus limites. Dá vontade de matar você.

Nesse momento percebi que, de fato, poderia matá-la se continuasse sacudindo a menina má daquele jeito. Assustado, soltei-a. Ela estava lívida e olhava para mim, de boca aberta, protegendo-se com os braços levantados.

- Não estou reconhecendo, este não é você murmurou, e sua voz sumiu. Começou a massagear a bochecha e a têmpora direita que, à meia-luz, pareciam inchadas.

- Estive a um triz de me matar por sua causa - repeti, com a voz impregnada de rancor e de ódio. - Subi no parapeito da ponte para me jogar no rio e um clochard me salvou. Um suicida, era o que faltava no seu currículo. Você pensa que vai continuar brincando assim comigo? Parece que só matando um de nós dois vou conseguir me libertar para sempre.

- Mentira, você não quer se matar nem me matar - disse, arrastando-se na minha direção. - Você quer é trepar comigo. Não é mesmo? Eu também quero. Ou, se esse termo o incomoda, quero que faça amor comigo. Era a primeira vez que ouvia esse palavrão na sua boca, um verbo que não escutava fazia séculos. Ela tinha se erguido um pouco para se acomodar nos meus braços e apalpava a minha roupa, escandalizada: "Você está todo encharcado, vai pegar um resfriado, tire logo essa roupa molhada, bobinho."

 "Se você quiser, me mata depois, mas faça amor comigo, agora mesmo." Tinha recuperado a serenidade e agora já era dona da situação. O coração quase me saía pela boca, eu mal podia respirar. Pensei que seria idiota ter um ataque justamente nesse momento. Ela me ajudou a tirar o paletó, a calça, os sapatos, a camisa - tudo parecia ter saído de dentro d'água - e, enquanto isso, passava a mão pelo meu cabelo na estranha, única carícia que às vezes se dignava a me fazer. "Como bate o seu coração, bobinho", disse, instantes depois, encostando a orelha no meu peito. "Fui eu que deixei você assim?" Eu também tinha começado a acariciá-la, antes mesmo de ter dominado a raiva. Mas esse sentimento se misturava agora com um desejo crescente que ela atiçava - tinha tirado o vestido de bailarina e me enxugava, deitada em cima de mim, movendo-se sobre o meu corpo - enfiando a língua na minha boca, fazendo-me engolir sua saliva, apanhando meu sexo, acariciando-o com as duas mãos e, por fim, encolhendo-se como uma enguia sobre si mesma, levando-o à boca. Eu a beijei, acariciei e abracei sem a delicadeza das outras vezes, mas com rudeza, ainda ferido, dolorido, e por fim obriguei-a a tirar o meu sexo da boca e ficar embaixo de mim. Abriu as pernas, docilmente, quando sentiu que meu membro rígido lutava para entrar nela. Penetrei-a com brutalidade e a ouvi uivar de dor. Mas não me rejeitou e, com o corpo tenso, esperou, soltando queixumes, gemendo baixinho, que eu ejaculasse. Suas lágrimas molhavam a minha cara e eu as lambia. Ela estava extenuada, com os olhos arregalados e o rosto transfigurado de dor.

- É melhor você ir embora, sumir de verdade - implorei, tremendo dos pés à cabeça. - Hoje estive a ponto de me matar, e depois quase matei você. Não quero isso. Vá, procure outro, alguém que faça você viver intensamente, como Fukuda. Alguém que chicoteie você, que a empreste para seus asseclas, que a faça engolir pós e depois soltar peidos no seu focinho imundo de porco. Você não foi feita para morar com um santarrão chato feito eu. Ela havia passado os braços em volta do meu pescoço e me beijava na boca enquanto eu falava. Todo o seu corpo se movia para ajustar-se mais ao meu.

- Não vou embora, nem agora nem nunca - sussurrou no meu ouvido.

- Não me pergunte por quê, não vou dizer nem morta. Jamais vou dizer que amo você, por mais que ame.

Nesse momento devo ter desmaiado, ou dormido de repente, mas já desde suas últimas palavras eu sentia que as forças me abandonavam e tudo começava a girar. Acordei muito depois, no quarto às escuras, sentindo uma forma morna metida dentro de mim. Estávamos deitados, debaixo dos lençóis e cobertores, e pela clarabóia do teto vi umas estrelas cintilando. Havia parado de chover há muito tempo, sem dúvida, porque os vidros já não estavam embaçados. A menina má continuava grudada no meu corpo, com as pernas enredadas nas minhas e a boca encostada na minha bochecha. Senti seu coração; pulsava, compassado, dentro de mim. A cólera havia evaporado e eu agora estava cheio de arrependimento por tê-la agredido e magoado, apesar de amá-la. Beijei seu rosto com ternura, tentando não acordá-la e sussurrei bem baixinho em seu ouvido: "Amo você, amo você, amo você." Não estava dormindo. Apertou-se contra mim e disse, colocando os lábios sobre os meus, enquanto sua língua bicava a minha entre uma palavra e outra:

- Você nunca vai viver sossegado comigo, estou avisando. Porque não quero que você se canse de mim, que se acostume comigo. Vamos nos casar para arrumar meus papéis, mas nunca serei sua esposa. Quero ser sempre sua amante, sua cachorra, sua puta. Como esta noite. Porque assim vai ficar sempre louquinho por mim.

Falava essas coisas me beijando sem trégua e tentando se meter inteira dentro do meu corpo
."
 Mario Vargas Llosa*

* Achei essa entrevista do Llosa, concedida à época do lançamento do livro, pra Folha. Tô lendo mais um livro dele "Pantaleão e as Visitadoras", e conto mais sobre ele quando terminar.  


domingo, 17 de novembro de 2013

Old but Gold: Dalí meets Disney

"Ainda tem muita gente que acha que animação é coisa de criança e que ir ao cinema pra ver um desenho da Pixar é perda de tempo. Se você está nessa turma, primeiro, meus pêsames. Segundo, não deixe de conferir a dica de hoje.

Pra começar, uma breve aula de arte sobre Salvador Dalí. Se você conhece o cara, pode pular pro próximo parágrafo, mas, se não é o caso, saiba que o pintor espanhol é o nome mais conhecido do surrealismo, vertente artística que envolveu escultura, pintura, literatura e até cinema. Sem grandes regras, esse tipo de arte é focado no impossível e no improvável, materializando imagens e ideias que costumam habitar o mundo dos sonhos.

Agora que você já sabe disso, vem a dica. Em 1945, Dalí começou uma parceria com Walt Disney para criar um desenho aos moldes do clássico Fantasia, chamado Destino. A história, segundo Dalí, era “uma exposição mágica sobre o problema da vida no labirinto do tempo”. Já segundo Disney, era sobre “uma garota em busca do amor”. Vê-se bem a diferença entre os dois.

O animador responsável pelo projeto era John Hench, que trabalhou em clássicos imortais como Peter Pan, Alice no País das Maravilhas e no próprio Fantasia. No entanto, apesar do time mais que ilustre, o projeto foi adiado por causa da crise financeira da época. Só que, em 1999, começaram os planos de concretizar a animação.

O produto final, um curta de mais ou menos 6 minutos, estreou em 2003 e contém os 17 segundos da animação original da década de 50 (o trecho das tartarugas). O filme concorreu ao Oscar de curta de animação em 2004, mas não levou a estatueta.

Mesmo que a Academia não tenha premiado a obra póstuma de Dalí e Hench, não tem como negar que Destino é uma obra de arte. Confira abaixo (esperamos que você saia daqui adorando animação)."
Fonte: Superinteressante

Eu já conhecia: a Ana postou esse vídeo no meu finado orkut, nem sei se ela se lembra. Sem dúvida, é uma obra de arte, e de uma beleza e sensibilidade tocantes. Mais um dos assuntos que queria abordar aqui faz tempo, mas que ficou mofando nos meus rascunhos.



sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Cegueira

Às vezes, abrir os olhos pode ser doloroso.


Fonte: 9Gag

Heartaches & Rocky Balboa

Botei "Orange Moon" no repeat pra escrever esse post, que é mais um esclarecimento do que qualquer outra coisa. Esclarecimento pra quê ou pra quem, não sei. O blog é meu, porra, eu faço o que eu quiser.

Mas, uns posts atrás, disse que tinha vontade de, ao invés de escrever bosta aqui, escrever sobre os livros que eu leio, motivo pelo qual alguns trechos dos meus livros favoritos tem aparecido aqui ao invés do usual mimimi.

Minha vida tá linda? Tô rycah? Tô amando? Mudei pra Pasárgada? Nenhuma das anteriores. Só decidi fazer do blog algo de útil pra mim. E quando digo "algo de útil" me refiro ao fato de que, na maioria esmagadora das vezes, tô falando de alguém ou pra alguém, o que nunca me trouxe resultado efetivo nenhum (a não ser eu me sentir babaca por falar as coisas, a pessoa ler e falar "legal, viu? cê escreve bem", e...só).

Se tem alguém cujo ego tem que ser inflado nessa porra, esse alguém sou eu.

Sendo assim, meu espaço vai servir pra falar do que me faz bem, e o que me faz mal vai ficar pra trás, do jeito que deve ser.

O melhor é mesmo esquecer, e pra esquecer o melhor é não falar. Na verdade, já não sinto a vontade que sentia antes de vir aqui e escrever my heart out. Sinto vontade, isso sim, de falar de coisas que me interessam, dos livros que eu leio, dos filmes que assisto, das exposições que quero visitar, das matérias da faculdade que eu gosto (e das que odeio)...

...E foi assim, e por isso, que decidi mudar o rumo das postagens, mudar os assuntos, virar o disco.

Quero agradecer ao meu mestre Rocky "The Italian Stallion" Balboa pelos sábios ensinamentos. Se não fossem os conselhos dele, continuaria perdendo tempo com idiotas. Muito obrigada, Rocky.



"Você tem namorado? Não, não tem namorado. Sabe por quê? Porque anda com esses idiotas pelas ruas. Essas companhias não a levarão a lugar algum. São uns trastes. Ande com gente boa, e terá bons amigos. Com gente esperta, e terá amigos espertos. Gente idiota, amigos idiotas. A matemática é simples."

Orange moon

Ainda com a noite como tema - mas com o dia já raiando - vou aproveitar e postar um vídeo de uma música que eu adoro.

Já nem me lembro como foi que a conheci...Mas foi amor ao primeiro play.

A letra é muito bonitinha, a voz da Erykah é linda...E fica esse "som de noite" ao fundo que, à medida que a música vai chegando ao fim, dá lugar ao "som da manhã": cigarras dão lugar aos passarinhos, e o dia amanhece em pouco mais de 7 minutos.



Tal qual minhas noites insônes. =) 

Night vision



quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Uns braços


"[...] Um domingo, — nunca ele esqueceu esse domingo, — estava só no quarto, à janela, virado para o mar, que lhe falava a mesma linguagem obscura e nova de D. Severina. Divertia-se em olhar para as gaivotas, que faziam grandes giros no ar, ou pairavam em cima d'água, ou avoaçavam somente. O dia estava lindíssimo. Não era só um domingo cristão; era um imenso domingo universal. 
Inácio passava-os todos ali no quarto ou à janela, ou relendo um dos três folhetos que trouxera consigo, contos de outros tempos, comprados a tostão, debaixo do passadiço do Largo do Paço. Eram duas horas da tarde. Estava cansado, dormira mal a noite, depois de haver andado muito na véspera; estirou-se na rede, pegou em um dos folhetos, a Princesa Magalona, e começou a ler. Nunca pôde entender por que é que todas as heroínas dessas velhas histórias tinham a mesma cara e talhe de D. Severina, mas a verdade é que os tinham. Ao cabo de meia hora, deixou cair o folheto e pôs os olhos na parede, donde, cinco minutos depois, viu sair a dama dos seus cuidados. O natural era que se espantasse; mas não se espantou. Embora com as pálpebras cerradas viu-a desprender-se de todo, parar, sorrir e andar para a rede. Era ela mesma, eram os seus mesmos braços.
É certo, porém, que D. Severina, tanto não podia sair da parede, dado que houvesse ali porta ou rasgão, que estava justamente na sala da frente ouvindo os passos do solicitador que descia as escadas. Ouviu-o descer; foi à janela vê-lo sair e só se recolheu quando ele se perdeu ao longe, no caminho da Rua das Mangueiras. Então entrou e foi sentar-se no canapé. Parecia fora do natural, inquieta, quase maluca; levantando-se, foi pegar na jarra que estava em cima do aparador e deixou-a no mesmo lugar; depois caminhou até à porta, deteve-se e voltou, ao que parece, sem plano. Sentou-se outra vez cinco ou dez minutos. De repente, lembrou-se que Inácio comera pouco ao almoço e tinha o ar abatido, e advertiu que podia estar doente; podia ser até que estivesse muito mal. 
Saiu da sala, atravessou rasgadamente o corredor e foi até o quarto do mocinho, cuja porta achou escancarada. D. Severina parou, espiou, deu com ele na rede, dormindo, com o braço para fora e o folheto caído no chão. A cabeça inclinava-se um pouco do lado da porta, deixando ver os olhos fechados, os cabelos revoltos e um grande ar de riso e de beatitude.
D. Severina sentiu bater-lhe o coração com veemência e recuou. Sonhara de noite com ele; pode ser que ele estivesse sonhando com ela. Desde madrugada que a figura do mocinho andava-lhe diante dos olhos como uma tentação diabólica. Recuou ainda, depois voltou, olhou dous, três, cinco minutos, ou mais. Parece que o sono dava à adolescência de Inácio uma expressão mais acentuada, quase feminina, quase pueril. "Uma criança!" disse ela a si mesma, naquela língua sem palavras que todos trazemos conosco. E esta idéia abateu lhe o alvoroço do sangue e dissipou-lhe em parte a turvação dos sentidos. "Uma criança!"
E mirou-o lentamente, fartou-se de vê-lo, com a cabeça inclinada, o braço caído; mas, ao mesmo tempo que o achava criança, achava-o bonito, muito mais bonito que acordado, e uma dessas idéias corrigia ou corrompia a outra. De repente estremeceu e recuou assustada: ouvira um ruído ao pé, na saleta do engomado; foi ver, era um gato que deitara uma tigela ao chão. Voltando devagarinho a espiá-lo, viu que dormia profundamente. Tinha o sono duro a criança! O rumor que a abalara tanto, não o fez sequer mudar de posição. E ela continuou a vê-lo dormir, — dormir e talvez sonhar.
Que não possamos ver os sonhos uns dos outros! D. Severina ter-se-ia visto a si mesma na imaginação do rapaz; ter-se-ia visto diante da rede, risonha e parada; depois inclinar-se, pegar-lhe nas mãos, levá-las ao peito, cruzando ali os braços, os famosos braços. Inácio, namorado deles, ainda assim ouvia as palavras dela, que eram lindas cálidas, principalmente novas, — ou, pelo menos, pertenciam a algum idioma que ele não conhecia, posto que o entendesse. Duas três e quatro vezes a figura esvaía-se, para tornar logo, vindo do mar ou de outra parte, entre gaivotas, ou atravessando o corredor com toda a graça robusta de que era capaz. E tornando, inclinava-se, pegava-lhe outra vez das mãos e cruzava ao peito os braços, até que inclinando-se, ainda mais, muito mais, abrochou os lábios e deixou-lhe um beijo na boca.
Aqui o sonho coincidiu com a realidade, e as mesmas bocas uniram-se na imaginação e fora dela. A diferença é que a visão não recuou, e a pessoa real tão depressa cumprira o gesto, como fugiu até à porta, vexada e medrosa. Dali passou à sala da frente, aturdida do que fizera, sem olhar fixamente para nada. Afiava o ouvido, ia até o fim do corredor, a ver se escutava algum rumor que lhe dissesse que ele acordara, e só depois de muito tempo é que o medo foi passando. Na verdade, a criança tinha o sono duro; nada lhe abria os olhos, nem os fracassos contíguos, nem os beijos de verdade. Mas, se o medo foi passando, o vexame ficou e cresceu. D. Severina não acabava de crer que fizesse aquilo; parece que embrulhara os seus desejos na idéia de que era uma criança namorada que ali estava sem consciência nem imputação; e, meia mãe, meia amiga, inclinara-se e beijara-o. Fosse como fosse, estava confusa, irritada, aborrecida mal consigo e mal com ele. O medo de que ele podia estar fingindo que dormia apontou-lhe na alma e deu-lhe um calefrio.
Mas a verdade é que dormiu ainda muito, e só acordou para jantar. Sentou-se à mesa lépido. Conquanto achasse D. Severina calada e severa e o solicitador tão ríspido como nos outros dias, nem a rispidez de um, nem a severidade da outra podiam dissipar-lhe a visão graciosa que ainda trazia consigo, ou amortecer-lhe a sensação do beijo. Não reparou que D. Severina tinha um xale que lhe cobria os braços; reparou depois, na segunda-feira, e na terça-feira, também, e até sábado, que foi o dia em que Borges mandou dizer ao pai que não podia ficar com ele; e não o fez zangado, porque o tratou relativamente bem e ainda lhe disse à saída:

— Quando precisar de mim para alguma cousa, procure-me.
— Sim, senhor. A Sra. D. Severina...
— Está lá para o quarto, com muita dor de cabeça. Venha amanhã ou depois despedir-se dela.

Inácio saiu sem entender nada. Não entendia a despedida, nem a completa mudança de D. Severina, em relação a ele, nem o xale, nem nada. Estava tão bem!falava-lhe com tanta amizade! Como é que, de repente... Tanto pensou que acabou supondo de sua parte algum olhar indiscreto, alguma distração que a ofendera, não era outra cousa; e daqui a cara fechada e o xale que cobria os braços tão bonitos...
Não importa; levava consigo o sabor do sonho. E através dos anos, por meio de outros amores, mais efetivos e longos, nenhuma sensação achou nunca igual à daquele domingo, na Rua da Lapa, quando ele tinha quinze anos. Ele mesmo exclama às vezes, sem saber que se engana: 
E foi um sonho! um simples sonho!"

Machado de Assis

Fonte da imagem: Polifonias
 

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Todo o Mundo e Ninguém

"Entra Todo o Mundo, rico mercador, e faz que anda buscando alguma cousa que perdeu; e logo após, um homem, vestido como pobre. Este se chama Ninguém e diz:

Ninguém: Que andas tu aí buscando?

Todo o Mundo: Mil cousas ando a buscar:
                         delas não posso achar,
                         porém ando porfiando
                         por quão bom é porfiar.

Ninguém: Como hás nome, cavaleiro?

Todo o Mundo: Eu hei nome Todo o Mundo
                         e meu tempo todo inteiro
                         sempre é buscar dinheiro
                         e sempre nisto me fundo.

Ninguém: Eu hei nome Ninguém,
               e busco a consciência.

Belzebu: Esta é boa experiência:
             Dinato, escreve isto bem.

Dinato: Que escreverei, companheiro?

Belzebu: Que Ninguém busca consciência.
              e Todo o Mundo dinheiro.

Ninguém: E agora que buscas lá?

Todo o Mundo: Busco honra muito grande.

Ninguém: E eu virtude, que Deus mande
               que tope com ela já.

Belzebu: Outra adição nos acude:
              escreve logo aí, a fundo,
              que busca honra Todo o Mundo
              e Ninguém busca virtude.

Ninguém: Buscas outro mor bem qu'esse?

Todo o Mundo: Busco mais quem me louvasse
                         tudo quanto eu fizesse.

Ninguém: E eu quem me repreendesse
               em cada cousa que errasse.

Belzebu: Escreve mais.

Dinato: Que tens sabido?

Belzebu: Que quer em extremo grado
              Todo o Mundo ser louvado,
              e Ninguém ser repreendido.

Ninguém: Buscas mais, amigo meu?

Todo o Mundo: Busco a vida a quem ma dê.

Ninguém: A vida não sei que é,
               a morte conheço eu.

Belzebu: Escreve lá outra sorte.

Dinato: Que sorte?

Belzebu: Muito garrida:
              Todo o Mundo busca a vida
              e Ninguém conhece a morte.

Todo o Mundo: E mais queria o paraíso,
                         sem mo Ninguém estorvar.

Ninguém: E eu ponho-me a pagar
               quanto devo para isso.

Belzebu: Escreve com muito aviso.

Dinato: Que escreverei?

Belzebu: Escreve
              que Todo o Mundo quer paraíso
              e Ninguém paga o que deve.

Todo o Mundo: Folgo muito d'enganar,
                         e mentir nasceu comigo.

Ninguém: Eu sempre verdade digo
               sem nunca me desviar.

Belzebu: Ora escreve lá, compadre,
              não sejas tu preguiçoso.

Dinato: Quê?

Belzebu: Que Todo o Mundo é mentiroso,
              E Ninguém diz a verdade.

Ninguém: Que mais buscas?

Todo o Mundo: Lisonjear.

Ninguém: Eu sou todo desengano.

Belzebu: Escreve, ande lá, mano.

Dinato: Que me mandas assentar?

Belzebu: Põe aí mui declarado,
              não te fique no tinteiro:
              Todo o Mundo é lisonjeiro,
              e Ninguém desenganado."