quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

"Not all those who wander are lost"

Já falei dela, já escrevi pra ela e sobre ela. Até que um dia, ela, que vinha vivendo uma vibe muito estranha e que queria muito me contar algo que talvez mudasse o que eu pensava sobre ela, insistiu pra que a gente se encontrasse "ai, só posso te contar pessoalmente". Nesse dia, imprevisto impediu que eu fosse ao encontro dela. Nesse dia, paramos de trocar mensagens. Nesse dia, minha amizade deixou de ter importância por conta de a ausência ser maior que a presença. E nesse dia, quem mudou aos olhos dela fui eu.

Desde o começo sempre a vi como alguém melhor. Que ouve os melhores discos, lê os melhores livros e blogs, tem as melhores frases de saudação de MSN. Aí veio Ouro Preto Carnaval 2007 e os cariocaixxxxx e o vinho de 90 centavos e as fotos de paisagem e o " Moço, onde a gente vê as coisas do Aleijadinho?" e várias outras coisas que fizeram dessa viagem o programa-de-índio mais falado e mais querido e mais revisitado da breve história da nossa amizade.

A gente falou de Chaves, de Hermes & Renato, de Clarice Lispector e Caio Fernando Abreu e Saramago e Gabo. A gente falou das nossas mães nordestinas que falam errado, gostam de Cidade Alerta e adoram um "TU VIU QUEM MORREU?!". Falamos dos brinquedos que não tivemos, da infância que não foi tão feliz mas foi sim, dos nossos filhos de quatro patas que não davam moral pra gente mas que deixavam a gente falida e muito feliz. A gente falava de muita coisa e por horas e dias e na lua-de-mel dela ela disse " Falo mais com você que com meu marido" e o assunto não acabava e a gente ria, fazia planos, entrava em crises existenciais, desabafava, brigava e fazia as pazes tudo com emoticons do Clodovil e de memes da internet.

E a cada aniversário a gente renovava os votos e as piadas e as tretas e as coxinhas com pimenta na Augusta. Pessoas entravam e saíam da vida da gente, mas a gente ficava na vida uma da outra, ainda que por mensagem, skype, facebook. Ela continuou sendo melhor, e com o passar do tempo foi melhorando mais: maquiagens, roupas, cabelo, viagens internacionais, fotografias nível pro. E eu fiquei sendo essa eu que prende o cabelo do mesmo jeito e usa o mesmo tênis e as mesmas roupas e a mesma bolsa de gatinho que ela me deu.

Ela se formou, se casou, se mudou. Engordou, emagreceu, enloireceu, enlouqueceu (quase). Desenhou, costurou, fotografou. E quanto mais dizia não saber o que fazer, mais eu via e sabia que ela podia fazer o que ela quisesse. Dela, da vida, do mundo. Porque ela era melhor.

Mas ela nunca deixou de ser pra mim o que eu pensava dela. Nem quando rompemos sem romper. Nem quando me bloqueou/excluiu das redes sociais dizendo que não queria "gente bizarra" stalkeando ela. Nem quando disse coisas muito duras pro meu bem que, de certo modo, me fizeram mal. Nem quando foi ausência ou zombou do que era pra ser levado à sério.

Então, mesmo não tendo ido ao encontro dela, sei que nada do que seria dito ali mudaria a forma como eu a vejo desde o primeiro scrap de Orkut. Porque mesmo depois de tudo, depois das perdas e viagens e porres e fotos e choros e bads e Bowies e carnavais, ela continua melhor. Ela abraça cada fase da vida e usa uma maquiagem, uma roupa e um corte de cabelo pra cada uma delas. E no fim das contas, só ela vai saber o quanto tudo doeu e não vai te contar: "Me deixa?"

E eu deixei. She's like a rainbow e eu ainda sou eu. Ela, que vivia me acusando de andar rápido demais e deixá-la pra trás, hoje tá lá na frente, e o único lugar em que a gente ainda se encontra é nos meus sonhos, em que ela tá feliz, tá bem, conhece pessoas modernosas e tá sempre me levando pra algum lugar que eu nem sei onde é mas que eu arrumo as malas e vou mesmo assim.

"Queria alguém que fosse comigo quando eu dissesse 'Vamo?'". E eu até acompanhei por um tempo mas não consegui manter o ritmo. Porque, ao contrário dela, eu me mantive eu, meu cabelo, minha cara lavada, minha bolsa de gatinho, meu all star preto. E, apesar de hoje talvez ser lembrada só como a loser bizarra que deu o cano nela quando ela mais precisou, pra mim ela vai ser sempre a menina véia besta que tinha um "bingo málino", que acha Rolling Stones melhor que "Bítous" e que queria ser andarilha e criar hipopótamos numa montanha. Vai ser sempre melhor.