quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O resumo do resumo

Chego na aula de Teoria Geral do Estado toda feliz. Finalmente consegui começar a ler o tal "Elementos de Teoria Geral do Estado", do Dalmo de Abreu Dallari, que o profº tinha pedido. Mais do que ler, ele pediu que a gente resumisse cada capítulo, entregando pra ele ao longo do semestre os fichamentos que valeriam, sei lá, meio ponto na média final. Não, não é meio ponto cada fichamento, mas meio ponto por TODOS eles. Pois é.

Mas tudo bem. Comecei a ler, tô entendendo tudo, até já comecei a sublinhar umas coisas que achei interessantes. Tô nesse pensamento de chegar na sala de aula e discutir tudo, esclarecer minhas dúvidas, debater com os colegas e tal quando o profº pede que a gente anote o que ele vai ditar. Tudo bem, na primeira aula ele tinha ditado bastante e lembro que até achei legal ele ter preparado tanta coisa pra passar pra gente. Mas eis que a primeira frase que ele dita eu reconheço de um dos parágrafos do texto lá do livro do Dallari. Igualzinho, sem tirar uma vírgula. E ele continua ditando e eu meio boquiaberta sem saber se continuava ou não, afinal, pra que diabos vou escrever DE NOVO o que já tenho no livro e vou resumir nos fichamentos? Quando ele pára, eu digo: "Mas profº, isso tá no livro do Dallari...". E ele: "Claro! Cê acha que eu invento as coisas que digo aqui?". Porra, eu ri porque fiquei sem ter o que dizer, de tão babaca que me senti. Sim, babaca. Porque se tô lendo o livro e resumindo cada capítulo pra escrever fichamentos por MEIO PONTO, o mínimo que eu esperava é que nas chamadas "aulas expositivas" a gente não seguisse direitinho o que tá escrito lá. E o que eu tô escrevendo de novo. E que vou escrever novamente quando chegar terça-feira na sala de aula e o profº começar a ditar tudo o que passei o fim de semana resumindo pros fichamentos dele. Deve ser alguma tática pra gente decorar o conteúdo.

Como se não bastasse, duas, três, quatro páginas que eu demorei um tempão pra resumir, com medo de deixar algum conceito relevante pra trás, o profº resume em três linhas. E passa por cima de tuuuuudo o que eu achava que a gente ia debater em sala de aula, de exemplos que poderiam ser citados, de notícias que a gente poderia usar pra ilustrar o que tá sendo explicado ali...CADÊ A AULA EXPOSITIVA, for fuck sake?!?!

Eu tenho numa pasta no computador, em PDF, os planos de aula de cada disciplina desse semestre. "Teoria Geral do Estado" aparece com a carga horária de 30h. Temos duas aulas dele por semana. Então, prefiro achar que é tudo culpa da pressa mesmo, muito conteúdo pra pouco tempo, sei lá. Mas não tive como deixar passar o fato de que, um ponto que é de grande destaque no primeiro capítulo do livro, sequer foi citado em sala de aula: a questão do poder social. Bem, o assunto é complexo mas vou tentar explicar (pelo menos pra isso vai servir os resumos ditados pelo profº): o primeiro capítulo do livro trata de sociedade, as teorias pro seu surgimento, as formas de organização, características, etc. O autor expõe as teorias do surgimento da sociedade como fenômeno natural - o homem como "animal político", dotado de instinto de sociabilidade, idéia defendida por Aristóteles, Cícero, São Tomás de Aquino entre outros - e como acordo de vontades, uma espécie de contrato hipoteticamente celebrado entre os homens - teoria oposta a do fundamento natural da sociedade e defendida por Hobbes, Locke, Montesquieu e Rousseau. Só entre esses caras já existem grandes diferenças (as idéias de Hobbes são absolutistas, enquanto as de Rousseau são hoje consideradas fundamentos da democracia, isso tá no livro!), mas o profº passou batido.

A parada vai ficando complexa porque, uma vez que já sabemos quais as teorias pro surgimento da sociedade, já sabemos que essas teorias são opostas, e sabemos também que a aceitação geral é um misto das duas, agora a gente vai ver quais são os elementos característicos dessa sociedade. E é aí que o bicho pega. Diz o autor que são três os elementos necessários pra que um agrupamento seja reconhecido como sociedade: finalidade, manifestações de conjunto ordenadas e poder social. Aí ele vai explicar cada uma delas e leva exatas quatro páginas pra isso, pois cada elemento se desdobra em correntes de pensamentos que divergem entre si: dentro de finalidade, por exemplo, nós temos os deterministas e os finalistas; as tais manifestações de conjunto ordenadas devem possuir reiteração, adequação e, claro, ordem; e por último porém não menos importante, vem o conceito de poder social.

"O problema do poder é considerado por muitos como o mais importante para qualquer estudo da organização e do funcionamento da sociedade, havendo mesmo quem o considere o núcleo de todos os estudos sociais. Na verdade, seja qual for a época da história da Humanidade ou o grupo humano que se queira conhecer, será sempre indispensável que se dê especial atenção ao fenômeno do poder". Lembra o tal ponto de grande destaque no capítulo que eu disse que o profº simplesmente tinha ignorado na aula? Pois é. Ele virou pra gente e ditou o seguinte: "O poder social é NECESSÁRIO, pois sem poder não há ordem, o que por sua vez impossibilita manifestações de conjunto e inviabiliza o alcance da finalidade". Ou seja, sem poder não há sociedade. Ele fala pra gente que a finalidade da sociedade é o bem comum, que pra atingi-lo a sociedade precisa buscar uma ação harmoniosa e que, pra isso, é necessário que exista o poder. Ponto. Shut your fuck up. As características do poder e as teorias que negam a sua necessidade simplesmente não existem. "Ah, vocês já ouviram falar dos anarquistas, né? Aquele povo punk e tal...Quando a gente pensa em anarquismo, a gente pensa em que? Em caos!", e ficou por isso mesmo, só pra não dizer que não falou no assunto. Nada de Santo Agostinho, Proudhon, Marx, Bakunin, Kropotkin...Sendo que tá tudo lá no livro.

Dúvidas: ele não falou por que não pega bem estudante de Direito sair falando em Bakunin ou por que não tinha tempo mesmo pra continuar nesse capítulo? E, mais importante: eu posso pular essa parte no meu fichamento também, já que tudo não passa de resumo do resumo?

Só sei que não teve discussão nenhuma, não abri a boca, ninguém questionou nada, não teve exemplo nenhum, e ele disse que semana que vem a gente vai ver como surgiu o Estado. Mal posso esperar.

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